Fracasso de acordo entre Opep e Rússia, corte dos preços na Arábia Saudita e avanço do coronavírus derruba preços do barril para perto de US$ 30, maior tombo desde a Guerra do Golfo.
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Os preços do petróleo, que já estavam em trajetória de queda em meio ao avanço da epidemia do novo coronavírus, desabaram nesta segunda-feira (9) para perto de US$ 30, na maior queda diária desde a Guerra do Golfo (1990 e 1991).
Na abertura dos negócios no mercado asiático, ainda no noite de domingo (horário de Brasília), o preço do petróleo do tipo Brent chegou a recuar 31%, atingindo mínimas que não eram registradas desde fevereiro de 2016. O barril do tipo Brent chegou a atingir US$ 31,02 , enquanto o WTI chegou bateu US$ 27,34.
O tombo veio depois que a Arábia Saudita iniciou uma guerra de preços contra a Rússia, ampliando ainda mais o ambiente de incerteza de investidores já preocupados com o coronavírus e o risco de uma recessão global.
Entenda abaixo as razões que explicam a queda dos preços do barril e os impactos na economia global e no Brasil:
Arábia Saudita anuncia redução de preço
A Arábia Saudita, maior exportadora de petróleo do mundo, decidiu adotar o maior corte dos preços do barril em 20 anos, o que detonou uma tempestade nos mercados. O país sinalizou também que elevará a produção para ganhar participação no mercado, que já está com sobreoferta devido aos efeitos do coronavírus sobre a demanda.
De acordo com a agência Bloomberg, a Arábia Saudita cortou entre 4 e 6 dólares o preço de seus barris para entrega em abril destinados à Ásia e em 7 dólares os destinados aos Estados Unidos.
Além de cortar o preço, a Arábia Saudita anunciou planos de aumentar a produção acima de 10 milhões de barris por dia (bpd) em abril, depois que a Rússia se recusou a aderir a cortes adicionais de oferta propostos pela Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) para estabilizar os mercados da commodity.
Fracasso de negociações com a Rússia e ‘guerra de preços’
A decisão da Arábia Saudita de reduzir o preço e aumentar a produção vem na esteira do fracasso das negociações entre Opep e a Rússia, que é o 3º maior produtor mundial e se opôs à proposta de cortes mais profundos na produção sugeridos pelos países do grupo para estabilizar os preços do petróleo. Como resposta ao governo da Rússia, a Opep removeu todos os seus limites de extração da commodity.
O fracasso nas negociações fez a cotação do petróleo cair 10% na última sexta-feira (6), a maior queda diária em mais de 11 ano.
A Rússia, por sua vez, aumentou a aposta, ao dizer nesta segunda-feira que o país poderia suportar preços do petróleo de entre US$ 25 e US$ 30 o barril por um período de entre seis e dez anos. O governo russo disse que poderia utilizar recursos do Fundo Nacional de Riqueza do país para assegurar a estabilidade macroeconômica se os preços baixos durarem por muito tempo.
A desintegração da chamada Opep+, formada pela Opep, a Rússia e outros produtores, acaba com mais de três anos de cooperação entre os países para apoiar o mercado.
A sigla Opep+ reunia um grupo de 24 países, responsável por cerca de metade do petróleo mundial. A aliança foi formada no final de 2016, quando países como Rússia, México e Cazaquistão também decidiram atuar em conjunto com a Opep para limitar a produção global de petróleo e buscar estabilizar o preço do petróleo acima de US$ 60, consolidando o bloco como um contraponto ao Estados Unidos, o maior produtor mundial de petróleo.
Pânico generalizado
O tombo nos preços do petróleo trouxe um ingrediente adicional de nervosismo para os mercados globais, que já vinham operando com estresse em razão do temor de uma recessão global.
“O avanço do coronavírus trouxe pânico para o mercado de petróleo”, diz o sócio fundador do Centro Brasileiro de Infraestrutura (CBIE), Adriano Pires. “O preço do petróleo nesse patamar deve provocar um estrago nas economias. O tamanho desse estrago vai depender por quanto tempo os preços ficarão nesse patamar.”
Com o derretimento generalizado das bolsas, os mercados passaram a temer uma crise da economia real, à medida que a epidemia de coronavírus afeta as cadeias de produção de todo o planeta, obriga o cancelamento de voos e de eventos profissionais e provoca a queda do turismo.
Para o vice-presidente de análise estratégica da ARM Energy, Keith Barnett, a permanência do preço do barril em patamares próximos a US$ 30 vai depender do ritmo da atividade econômica.
“Esse ambiente de menor preço deve ter duração limitada, de alguns meses, a não ser que todo o impacto desse vírus sobre os mercados globais e a confiança do consumidor leve à próxima recessão”, disse o vice-presidente de análise estratégica da ARM Energy, Keith Barnett.
Queda da demanda e impactos na economia
A queda dos preços derrubou as bolsas no mundo todo, afetando mais diretamente as empresas que exploram petróleo e os investimentos no setor.
O Goldman Sachs cortou sua previsão para os preços do petróleo Brent para o segundo e terceiro trimestres de 2020 para US$ 30 o barril, “com possíveis quedas de preços para níveis de estresse operacional e custos de caixa bem próximos de 20 dólares o barril”, conforme relatório a clientes.
Já a Agência Internacional de Energia (AIE) estimou que a demanda mundial de petróleo deverá cair este ano, pela primeira vez desde 2009. Segundo a entidade, a demanda deverá ter contração de 90.000 barris diários (bd) na comparação com 2019, de acordo com a hipótese central da agência, que leva em consideração a “extrema incerteza” da situação.
O diretor executivo da IEA, Fatih Birol, pediu que produtores tenham “comportamento responsável” após o colapso de um acordo para restrição de oferta entre Opep e Rússia. “Em um momento desses, de incerteza e potencial vulnerabilidade da economia global… jogar roleta russa com os mercados de petróleo pode ter consequências graves”, disse.
Ele acrescentou que preços baixos podem colocar importantes países produtores, como Iraque, Angola e Nigéria, sob “enormes” dificuldades financeiras, alimentando pressões sociais.
Impacto nos lucros e na arrecadação com royalties
As ações da Saudi Aramco – a empresa nacional saudita que produz 9 milhões de barris por dia – caíram 10%, provocando uma perda US$ 320 bilhões no valor de mercado da gigante do petróleo que entrou na Bolsa em dezembro.
Já as ações da Petrobras desabaram mais de 25% nos primeiros negócios desta segunda-feira, na esteira do tombo do petróleo no exterior.
O tombo da cotação pode afetar inclusive a rentabilidade dos projetos de exploração no pré-sal, que foram planejados levando em conta um preço do barril acima de US$ 40 para a produção poder ser considerada economicamente viável.
A queda da cotação internacional deve provocar também uma diminuição na arrecadação dos royalties sobre a produção neste ano, afetando a receita do governo federal e também das prefeituras e governos de estados produtores.
Efeitos nos preços de combustíveis
O tombo nos preços internacionais deve levar, em tese, a uma redução também nos preços dos combustíveis. Esse repasse, no entanto, não costuma ser automático, nem integral. No Brasil, reduções de preços nas refinarias costuma levar semanas para chegar até o preço final pago pelos consumidores.
Na avaliação de Pires, a queda brusca dos preços do petróleo pode levar o Brasil para dois caminhos: a Petrobras pode reduzir o preço da gasolina e do diesel, mas com o risco de inviabilizar o etanol, ou o governo pode aumentar a incidência da Contribuição de Intervenção do Domínio Econômico (Cide) sobre os combustíveis para preservar a geração de receita da estatal.
Desde a greve dos caminhoneiros, a Cide está zerada para o diesel. Na gasolina, a cobrança é de 10 centavos por litro. “A grande prejudicada com essa queda no preço pode ser a Petrobras. Vamos ver como o governo vai agir”, afirmou Pires.
Neste ano, a queda do preço do petróleo tem levado a Petrobras a reduzir o preço dos combustíveis nas refinarias. A última redução ocorreu no fim de fevereiro. Os preços do diesel foram reduzidos em 5% e os da gasolina em 4%.
Informações de: G1