Modelos estão disponíveis para qualquer pessoa que tenha o equipamento e queira ajudar
Uma das grandes dificuldades enfrentadas no combate à disseminação do novo coronavírus é a falta de equipamentos de proteção para os profissionais de saúde. Para driblar o problema, as universidades e a sociedade civil estão imprimindo protetores faciais em 3D e distribuindo o material gratuitamente nos hospitais.
A iniciativa ocorre com o envolvimento de pelo menos seis universidades: UFRJ (Universidade Federal do Rio de Janeiro), UFF (Universidade Federal Fluminense), PUC-Rio (Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro), Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro), UFPR (Universidade Federal do Paraná) e UFOB (Universidade Federal do Oeste da Bahia).
A comunidade dos “makers”, pessoas engajadas na fabricação de produtos a partir da impressão 3D, também tem sido essencial no auxílio ao combate da pandemia.
A máscara produzida por meio deste processo se chama “face shield”. É composta por um suporte, impresso em 3D, e por uma película de plástico que cobre todo o rosto. Na UFRJ, protótipos desses protetores faciais foram desenvolvidos por meio de uma parceria entre centros da universidade e o Hospital Universitário Clementino Fraga Filho.
Um grupo de trabalho montado na universidade para ajudar na contenção do vírus utilizou modelos disponibilizados em código aberto pela empresa Prusa como base para a ideação do protótipo.
A partir daí, fizeram ajustes para satisfazer os requisitos da Anvisa, imprimiram em 3D e levaram as máscaras ao Hospital Universitário, onde foram avaliadas por uma equipe de profissionais de saúde.
A Anvisa publicou um decreto na segunda-feira (23) que permite, excepcionalmente, a fabricação de equipamentos de proteção sem autorização ou notificação ao órgão, desde que cumpridas as exigências de controle sanitário.
O médico infectologista Alberto Chebabo, do hospital Clementino Fraga Filho, afirma que as máscaras impressas em 3D têm a mesma eficácia das comuns.
“A gente testou para ver se é confortável, se não cai, se tem um nível de proteção adequado ao rosto e se dá para botar uma máscara comum junto ao protetor. Se testou, [viu que] é funcional e protege o rosto, pode ser usada”, diz.
As máscaras estão sendo impressas em massa pela sociedade civil, e por universidades como a Unirio (Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro) e a PUC (Pontifícia Universidade Católica). O objetivo é enviá-las para a secretaria de Estado de Saúde, que ficará responsável pela logística da distribuição. A expectativa é de que sejam produzidos entre 4.000 e 5.000 protetores faciais.
O modelo da UFRJ também está sendo disponibilizado para qualquer pessoa que queira imprimir os protetores com o intuito de doá-los. Assim, outros estados e municípios podem se beneficiar do trabalho de ideação realizado pela universidade.
“Acho que foi o produto mais rápido que já vi a gente gerar”, afirma o professor da Coppe/UFRJ, Guilherme Travassos. “A maior parte está sendo impressa pelos produtores da sociedade civil. Se não fossem eles, não teria resolvido. A gente sabe fazer, mas não tem escala. Tem máquinas excelentes, mas uma máquina, e leva tempo para imprimir as peças.”
O engajamento tomou corpo em um grupo de whatsapp formado por alunos e professores da UFRJ envolvidos com esse método de impressão. Um dos integrantes sugeriu que utilizassem seus equipamentos para ajudar na contenção do coronavírus. A partir daí, o grupo passou a se chamar SOS 3D COVID-19.
A maior parte dos suportes das máscaras estão sendo impressos na casa do engenheiro mecânico Pedro Accioly, formado pela UFRJ e dono de uma empresa de impressão em 3D. Com o empréstimo de amigos e outros ex-alunos, ele conseguiu reunir 15 impressoras para tocar a produção.
Depois que o suporte é impresso, o próximo passo é a montagem das máscaras, realizada em conjunto com a PUC. A faculdade fez uma grande compra de películas, e tem máquinas que permitem o corte a laser, necessário para recortar o plástico no tamanho correto.
Accioly já produziu cerca de 350 unidades, doadas e distribuídas ao Hospital Federal de Bonsucesso, ao Hospital Universitário Clementino Fraga Filho, e ao Hospital Souza Aguiar.
Cada máscara tem um custo de produção de R$ 6. O engenheiro afirma que o grupo já conseguiu arrecadar R$ 27 mil para dar continuidade aos trabalhos. Ele ressalta que todos que têm impressoras 3D em casa podem ajudar.
“Nosso foco é mais nessa linha da comunidade maker, esse pessoal que tem o equipamento em casa. A gente consegue fornecer todas as informações, se a pessoa quiser ajudar. Qual o arquivo, o material, tudo mastigado para ela realmente só colocar na máquina”, diz.
Na UFF, a movimentação começou no último sábado (21), quando o reitor Antonio Claudio da Nobrega montou um grupo multidisciplinar para a produção dos “face shields”.
Assim como na UFRJ, a partir do projeto público da máscara desenvolvido pela Prusa, o mestrando Lucas de Lima trabalhou em modificações com o auxílio da equipe médica do Huap (Hospital Universitário Antônio Pedro).
Um protótipo aprovado pela equipe foi impresso e um ofício foi enviado por precaução à Anvisa e ao Inmetro, que liberou o uso do equipamento.
As impressões são realizadas por pesquisadores da UFF que têm o equipamento em casa, enquanto a montagem é feita na casa de Lima. Na próxima semana, a produção será centralizada em um espaço na escola de engenharia.
O Huap fez um pedido inicial de 1.000 máscaras, que também devem ser distribuídas para a rede do SUS em Niterói. Lima afirma que há a possibilidade, ainda, de que as máscaras passem a ser produzidas industrialmente, com moldes injetáveis.
Dessa forma, poderiam ser feitas milhares de unidades por dia, enquanto no espaço caseiro, a média é de uma a cada duas horas. O mestrando afirma que, para isso, está em contato com a Firjan Senai.
Por enquanto, o financiamento das máscaras está sendo feito pelos próprios professores. Empresas também procuraram o grupo para oferecer material. No site da FEC (Fundação Euclides da Cunha), instituição ligada à UFF, é possível encontrar os dados bancários para doar dinheiro à iniciativa.
A UFPR (Universidade Federal do Paraná) também está produzindo máscaras por meio da impressão 3D. O trabalho é realizado por integrantes de um projeto de extensão do curso de Engenharia Mecânica.
Os hospitais de Curitiba solicitaram mais de 3.000 máscaras ao grupo, que foram às redes sociais pedir ajuda a qualquer pessoa que tenha uma impressora 3D e que se disponha a participar da produção.
Um laboratório de fabricação digital (FabLab) da Prefeitura de Curitiba também deve começar a produzir, nesta quinta-feira (26), máscaras de proteção a partir da impressão 3D. A expectativa é de que 220 unidades sejam fabricadas diariamente.
Na Bahia, integrantes do projeto “Face Shield for Life 3D” já produziram 422 máscaras de proteção. A iniciativa conta com voluntários da sociedade civil e professores de escolas e universidades do estado, como a Universidade Federal do Oeste da Bahia.
No site do grupo, são disponibilizados arquivos para impressão, destinados aos que têm o equipamento em casa e querem participar.
O projeto já arrecadou mais de R$ 35 mil em doações online. A primeira demanda atendida será a do hospital Couto Maia, mas a secretaria de saúde do Estado da Bahia ainda indicará outras unidades que precisam das máscaras.
Informações de Folha de São Paulo.