A Polícia Federal deflagrou nesta sexta-feira, 1º de novembro, uma operação contra uma empresa grega apontada pelos investigadores como a responsável pela embarcação que derramou o óleo que atinge nove Estados brasileiros desde o fim de agosto.
O nome da empresa não foi divulgado. Foram cumpridos dois mandados de busca e apreensão na capital fluminense, em sedes de representantes e contatos da companhia grega no Brasil, na operação batizada de Mácula.
Segundo os investigadores, o derramamento de óleo ocorreu a cerca de 700 km na costa brasileira no fim de julho. Mais específicamente, um trabalho de geointeligência identificou uma mancha a 733km (395 milhas náuticas) a oeste do Estado da Paraíba.
De acordo com a Polícia Federal, “a embarcação, de bandeira grega, atracou (no porto San José) na Venezuela em 15 de julho, permaneceu por três dias, e seguiu rumo a Singapura, pelo oceano Atlântico, vindo a aportar apenas na África do Sul. O derramamento investigado teria ocorrido nesse deslocamento”.
A Interpol também realiza diligências no exterior contra os acusados de crimes ambientais.
Os investigadores afirmaram, com base em informações da Marinha, que “não há indicação de outro navio que poderia ter vazado ou despejado óleo, proveniente da Venezuela”. A embarcação ficou detida nos Estados Unidos por quatro dias, “devido a incorreções de procedimentos operacionais no sistema de separação de água e óleo para descarga no mar”.
A apuração sobre quando e onde começou o incidente passou principalmente pela combinação de cinco elementos: densidade do óleo, datas de avistamento nas praias, correntes marinhas do oceano Atlântico, direção e intensidade dos ventos e rotas das embarcações.
Dados de tráfego marítimo, por exemplo, indicavam inicialmente mais de mil embarcações trafegando na região onde possivelmente teria ocorrido o vazamento. Mas a investigação afunilou essa soma para 30 navios-tanque.
De acordo com os procuradores da República Cibele Benevides e Victor Maris, “há fortes indícios de que a empresa, o comandante e a tripulação do navio deixaram de comunicar às autoridades competentes sobre vazamento/lançamento de petróleo cru no Oceano Atlântico”.
Os procuradores afirmam que a busca e apreensão foi necessária para coletar documentos que ajudem a esclarecer os fatos. Para o Ministério Público Federal, o impacto do derramamento de óleo tem “proporções imensuráveis”.
Além da Polícia Federal, as investigações envolveram também Marinha, Ministério Público, Ibama, Agência Nacional do Petróleo, a Universidade Federal da Bahia, Universidade de Brasília e Universidade Estadual do Ceará.
Desde o fim de agosto, já foram atingidas 286 praias em 98 municípios foram atingidas pelo óleo segundo o Ibama. O relatório mais recente do órgão aponta a morte de 81 animais em decorrência do vazamento.
Responsabilização judicial
Existem duas esferas de responsabilização neste caso: civil e criminal. No caso da responsabilização civil, o objetivo do Brasil será buscar indenização para cobrir todos os danos econômicos e ambientais, de curto e longo prazo, provocados pelo vazamento.
Já no âmbito criminal, será preciso identificar se houve dolo ou culpa, ou seja, se as pessoas envolvidas tiveram a intenção de cometer aquele crime ou assumiram o risco de que esses danos ocorressem.
Segundo a professora de Direito Marítimo Ingrid Zanella, da Universidade Federal de Pernambuco, o responsável principal costuma ser o dono da embarcação responsável pelo incidente.
O capitão do navio também pode ser punido, especialmente criminalmente, já que era o responsável pela embarcação.
Mas todas as empresas e até países envolvidos na operação, como a companhia que receberia a mercadoria e o país que vendeu o produto, podem eventualmente ser processados e obrigados a pagar indenizações pelos danos econômicos e ambientais provocados.
Os responsáveis pelos danos responderão nas esfera cível, com pagamento de multa e indenização, e penal, segundo a Lei de Crimes Ambientais, de 1998.
Esta legislação prevê pena de um a cinco anos de reclusão para quem “causar poluição de qualquer natureza em níveis tais que resultem ou possam resultar em danos à saúde humana, ou que provoquem a mortandade de animais ou a destruição significativa da flora”, quando o crime “tornar uma área, urbana ou rural, imprópria para a ocupação humana, causar poluição atmosférica que provoque a retirada, ainda que momentânea, dos habitantes das áreas afetadas, ou que cause danos diretos à saúde da população, causar poluição hídrica que torne necessária a interrupção do abastecimento público de água de uma comunidade, dificultar ou impedir o uso público das praias, e ocorrer por lançamento de resíduos sólidos, líquidos ou gasosos, ou detritos, óleos ou substâncias oleosas, em desacordo com as exigências estabelecidas em leis ou regulamentos”.
A mesma lei ainda prevê pena de detenção de um a três anos e multa a quem “tem o dever legal ou contratual de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental e deixar de fazê-lo”.
Danos ambientais
Segundo Flávio Lima, coordenador-geral do Projeto Cetáceos da Costa Branca, da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte, do ponto de vista ambiental, o dano causado por esse vazamento é um dos maiores já registrados no Nordeste.
Para minimizar os danos, instituições se uniram para ajudar no cuidado com fauna marinha, como “retirar o excesso de óleo das mucosas (olhos, narinas, bico e cloaca) e oferecer antitóxico (carvão ativado por via oral), sondas com protetores gástricos, renais e hepáticos e por fim, a lavagem”, explica ele.
O petróleo causa impacto ao meio ambiente e seres humanos. Segundo a bióloga Waltyane Bomfim, do Instituto Biota, o óleo prejudica inicialmente as algas e outros microrganismos, os quais servem de alimento para organismos maiores (peixes, aves, mamíferos, tartarugas). Luciana também concorda com o professor Flávio: o dano é um dos mais graves que o Nordeste já enfrentou.
Por conta dos riscos, o Ibama produziu uma cartilha para que as prefeituras manejem o material que vem sendo encontrado. Entre as recomendações está a de que, “em hipótese alguma, o óleo pode ser enterrado ou misturado com outros tipos de resíduos”.