O carnaval do Rio de Janeiro sofreu seu segundo cancelamento na história em 2021, por causa da pandemia da Covid-19. A primeira vez foi em 1918, por causa da gripe espanhola, que deixou pelo menos 15 mil mortos.
Este ano, a suspensão dos desfiles das escolas de samba e dos blocos de rua, o “não-carnaval” poderia ter sido o da conscientização e do respeito ao distanciamento social.
Mas, ao contrário, o que se viu nos quatro dias foram aglomerações e festas clandestinas em casas de show, na areia das praias, nos bares e no mar.
Na terça de carnaval o estado do Rio registrou o maior número de casos de Covid-19 em um só dia: 8.385. No total, o RJ tinha 31 mil 630 mortes, segundo a secretaria Estadual de Saúde.
O Sambódromo vazio ganhou luzes com as cores das agremiações do carnaval carioca, uma homenagem aos mortos pela Covid na cidade.
A chave da cidade, que normalmente é entregue ao Rei Momo, foi recebida por profissionais de saúde.
Do Leblon, na Zona Sul, até a Favela da Maré, na Zona Norte, foram muitas as imagens das festas que desrespeitaram as orientações das autoridades. A fiscalização autuou, multou e fechou estabelecimentos.
Até a última atualização, eram 27 os estabelecimentos comerciais interditados por aglomerações entre sexta-feira (12) e terça-feira (16). No mesmo período foram 54 infrações por descumprimento de medidas de proteção.
Resumo dos principais acontecimentos no carnaval 2021 no RJ
Aglomerações
LEBLON – o bairro da Zona Sul pode ser considerado um dos pontos críticos nas aglomerações e festas. O Leblon, a Lapa, no Centro da cidade, e a Barra da Tijuca, na Zona Oeste, registraram o maior número de infrações cometidas, segundo levantamento da Prefeitura nesta terça-feira (16).
No balanço oficial, dois guardas municipais ficaram feridos após serem atingidos por garrafas de vidro em uma ação no Leblon. Uma pessoa foi detida por desacato.
O bairro, conhecido pela sofisticação e alto poder aquisitivo, atraiu turistas e cariocas nos festejos de carnaval mesmo na pandemia. Ali, poucos seguiram as regras do distanciamento.
Um outro modelo de festa clandestina deu trabalho para a fiscalização.Até esta terça, 63 embarcações foram impedidas de zarpar para fazer festas no mar.
O secretário de Ordem Pública do Rio, Brenno Carnevalle, fez um levantamento com a Capitania dos Portos sobre os eventos clandestinos em embarcações.
A Polícia Civil monitorou páginas da internet que ofereciam festas no carnaval e chegou a pedir bloqueio de bens das empresas que organizaram os eventos.
Desde a sexta-feira (12) foram instaladas barreiras de fiscalização nos acessos do Rio para impedir aglomeração no carnaval.
Os bloqueios irão funcionar até a próxima segunda (22). A circulação de vans e ônibus fretados está proibida por decreto municipal.
“As equipes de fiscalização estão sendo tratadas com muita hostilidade. Isso não vai impedir a gente de trabalhar, de fazer o que é um projeto de transformação da cidade para a gente sair de um estágio de transmissão alto”, disse o secretário.
VIDIGAL – Agentes da Ordem Pública e policiais militares interditaram e lacraram na tarde desta terça o Bar Alto Vidigal por aglomeração.
O Bar da Lage e o Mirante do Arvrão foram multados. No Arvrão, um evento foi adiado para domingo (21). A fiscalização foi ao local após denúncia do Bom Dia Rio. O telejornal exibiu imagens do local lotado no início da manhã desta terça.
FAVELA DA MARÉ – Já na sexta-feira de carnaval , uma das festas clandestinas aconteceu no Parque União, na Maré, onde o cantor Belo se apresentou num Ciep, escola pública da comunidade. Fãs postaram vídeos nas redes sociais na hora do show.
O flagrante foi feito pelo Globocop no início da manhã de sábado (13) quando o baile prosseguia. As imagens mostraram a quadra lotada diante de um palco com luzes e amplificadores de som.
Neste sábado (15), a Polícia Civil abriu um inquérito para apurar as circunstâncias do show do cantor na comunidade. A polícia quer saber quem pagou o cachê do artista. Belo deverá ser ouvido pela Delegacia de Repressão aos Crimes de Informática nesta quinta-feira (18).
A assessoria do cantor enviou uma nota sobre o show na Maré.
“Fizemos o show seguindo todos os protocolos. Não temos controle do geral. Isso nem os governantes têm. As praias estão lotadas, transportes públicos, e só quem sofre as consequências são os artistas. Que foi o primeiro segmento a parar, e até agora não temos apoio de ninguém sobre a nossa retomada. Sustentamos mais de 50 famílias.”
Lapa – Na manhã de domingo (14), a GloboNews flagrou algumas pessoas aglomeradas e sem máscara, em um bar no bairro.
Os frequentadores estavam consumindo bebida alcoólica em pé, o que é proibido pela Prefeitura, e tocavam músicas com um tamborim e um pandeiro.
CIDADES TURÍSTICAS DO RJ
O carnaval também deu muito trabalho para os agentes da fiscalização em algumas das principais cidades da Região dos Lagos onde as festividades também foram canceladas por causa da pandemia.
Mesmo com as determinações das autoridades, foram registradas aglomerações em pelo menos quatro cidades da região: São Pedro da Aldeia, Cabo Frio, Araruama e Búzios. Em Maricá, também houve registros.
Uma das festas em Cabo Frio foi dispersada pelo Batalhão de Choque da PM. O evento acontecia na Praia do Forte na segunda-feira (15). As pessoas se aglomeravam sem máscaras ou distanciamento. Os PMs usaram bombas de efeito moral.
Em Búzios, 11 festas foram suspensas no sábado (14). Seis delas eram clandestinas e quatro aconteciam em casas noturnas. Todas, segundo a fiscalização do município, desrespeitavam as regras determinadas pela Prefeitura.
No Sul do estado, a cidade de Paraty ficou mais vazia neste carnaval. A secretaria de Turismo da cidade tinha feito uma previsão para taxa de ocupação entre 60% a 70%, mas só alcançou 50%. Não houve registro de aglomerações nem nos passeios de barco que são tradicionais na região.
A secretaria informou que se a vacinação ocorrer dentro do prazo e da expectativa que se tem, a cidade poderá ter um carnaval fora de época no início de julho.
RUAS SEM BLOCOS x INTERNET
Os blocos carnavalescos do Rio não fizeram festas nas ruas no carnaval 2021.
Nos locais por onde eles costumavam arrastar multidões desde o início das manhãs de carnaval, as ruas ficaram vazias. O G1 mostrou as diferenças de movimento na cidade este ano, em relação a outros carnavais.
Pelas redes sociais, os blocos mais conhecidos da cidade fizeram eventos e lives para os público curtir a folia de forma virtual e em segurança, em casa.
Cordão do Boitatá – uma das lives mais comentadas pelos foliões foi do bloco que está completando 25 anos. Eles ficaram no ar por quase quatro horas.
O músico Kiko Horta disse que a palavra que define o carnaval de 2021 é desafio.
“Foi um ano de desafio e ainda temos muitos outros pela frente em todos os aspectos até que todo mundo esteja vacinado e a gente volte a brincar nas ruas. Foram três horas e 45 minutos de live, com muitas marchinhas, homenagens, participações especiais para que a gente pudesse levar a alegria às pessoas nos 25 anos do Boitatá. Foi muito emocionante. É claro que a gente preferia estar nas ruas com o pessoal que nos acompanha, com os quase cem músicos da banda, mas a live foi a forma que a gente encontrou de levar essa alegria, esse carinho para quem curte o Boitatá. Nada substitui o carnaval de verdade, mas estamos num momento diferente e não podia ser diferente. Tinha de ser em casa. Então, fizemos o carnaval possível. O carnaval é uma força vital que não pode morrer”, disse.
Sebastiana – desde o início da discussão sobre ter ou não carnaval este ano no Rio, a Sebastiana, Associação Independente dos Blocos de Carnaval de Rua da Zona Sul, Santa Teresa e Centro da Cidade do Rio de Janeiro, se manifestou contrária à realização do evento.
A presidente da associação, Rita Fernandes, afirmou que não havia condições sanitárias para a festa no momento.
Nesta terça, ela revelou ao G1 um “sentimento de vazio dentro do peito”. Rita disse que, esse ano, sem desfiles e sem bailes, foi como se o carnaval ainda não tivesse chegado.
“É um sentimento de vazio, de tristeza, de estranhamento. Passei esses dias pensando nos encontros, nos ensaios, que em determinado momento estaria ajudando a organizar um desfile, não teve as madrugadas vendo a transmissão dos desfiles das escolas de samba, não vai ter a feijoada para juntar os amigos e acompanhar a apuração. É tudo muito triste. Mas ao mesmo tempo esse vazio abre um espaço enorme para a esperança de que no próximo ano a gente possa estar junto para matar as saudades e celebrar, extravasar, botar a alegria para fora. Não dá para fazer carnaval nesse clima de pandemia, com as pessoas morrendo. Blocos e escolas de samba não foram para as ruas porque não dava para imaginar ir na contramão das medidas de segurança”, disse
Rita também criticou as festas clandestinas na cidade que marcaram este carnaval.
“Fico assustada com essa meia dúzia de irresponsáveis, cafonas e alienados que fizeram essas festas clandestinas na contramão das medidas sanitárias. Para nós, que fazemos carnaval, foi uma dor imensa, mas ficamos todos em casa. Aí tem esse pequeno grupo que não respeita ninguém. Fiquei indignada”, afirmou.
Sambistas sonham com 2022
O carnaval 2022 no Rio de Janeiro pode ser uma reedição do carnaval de 1919, considerado por muitos, até hoje, como o melhor de todos os tempos. Foi chamado de “carnaval da ressurreição” e “carnaval da revanche” ao final da gripe espanhola.
Rio sem carnaval: profissionais falam de superação e esperança para 2022
Uma reportagem do G1 mostrou que os sambistas cariocas sonham com 2022 épico para compensar o cancelamento da folia este ano.
“Em 2022, vamos ter um carnaval inesquecível”. A frase poderia ser de qualquer um dos milhares de profissionais que vivem do carnaval – ou de um dos milhões de ansiosos foliões. Mas é de Pedro Ernesto, presidente do Cordão da Bola Preta, bloco nascido no Rio de Janeiro, exatamente no fim do ano da pandemia da gripe espanhola.